quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Pássaro

Do Pássaro

Sal e Sol

Canto o sal e sol e sombra e nada 

a calma certa azul na mão

e sem pudor a falsa salta 

cai incerta, rubra cai.


Não se rasgou esse selo

mas nada te segue em vão

longos novelos na lama,

cálida a mão quebrou

secou


No céu velado de outras faces

no silêncio pós-ardor.

No chão, na cal apaixonada

canta e cai o sol é seu.


Não se rasgou esse selo

mas nada te fere em vão

longos novelos na lama,

gélida a mão secou

quebrou


A cor acalma, a areia passa

deixa um mundo, um fundo só

quebrou a chama mal-fechada,

chega o falso e sem terror...


Cai derrotado o novelo

pela canção abriu.

Ínfima a sombra revela

lágrimas, mãos a dois

a deus.


Saia


Levanta mais a tua saia

que o vento assim não ouve as tuas pernas cantar

dançar

nas tuas ancas é segredo

mas basta o 

mar 

subir

pelos poros, dois pólos tocados, chocados, abertos


A dança também contracurva o olhar primeiro

será fim, será fogo

da saia que sobe, que canta que sobe e que toca a fugir

sempre dentro de mim a fugir


Levanta mais os meus dois olhos

que o mundo assim não sonha as tuas pernas chegar

cantar

nas tuas ancas mete medo

mas basta o 

mar

subir

pelos poros

 

A dança também contracurva o olhar primeiro

da saia que sobe, que canta e que sobe e que toca a fugir

sempre dentro de mim a fugir


A dança também contracurva o olhar primeiro

será fim, será todo

da saia que sobe e que canta e que sobe e que toca a fugir

sempre dentro de mim a fugir


SenTi


Senti

Nos calmos cabelos a sombra da 

luz inteira, quente e cheia, cheiros longos

lua a sol,


Venci

As hordas as vespas as ondas 

subi bandeiras, quartas-feiras quis mentiras

dancei só


Perdi

Quando os teus lábios cansei

por pensar que eram rotina

Estes passos para ti

danço Abril canto a cair

volto à rua de onde vim sem ti


Cantei

A cor e segredos que sinto por ti 

a volta, sonho as voltas, quero a mão que 

agarra a mão


Perdi

Quando os teus lábios larguei

por julgar que eram mentira

Estes passos só p'ra ti

danço Abril quero cair

junto ao berço dos teus olhos

canto Abril quero-te a ti

ser o braço dos teus berços.


O Pássaro


À falta de penas

cumpri outro ar

que sabem os homens

do triste bater das almas


Vi lagos abertos

fantasmas sem luz

que querem os astros

do lento saber dos erros


Incêndios da calma, na boca o veloz enterro

Inventos pecados são facas sem medo.


Grinaldas de oliva

um ninho no alto

o mundo espalmado

o doce bater das palmas


Incêndios da calma, na boca o veloz enterro

Inventos pecados são facas sem medo.


Letras: Gonçalo Miragaia para Pássaro - 2009

terça-feira, 28 de julho de 2009

NINFO

A veia poética dos NINFO. Neste baú encontrámos as metáforas das relações a dois, as vicissitudes da arte, a velhice, todos conceitos universais que são tão bem tratados pela caneta-espada destes nossos MARujos. 


Trilhos


Muros criados em dias sem luz 

Palavras pensadas que não consigo dizer

Emoções contidas na paz que me seduz

Parto neste barco para algo fazer


São brancas as folhas onde me exprimo

Negras as linhas por onde caminho

Contrastes que habitam em mim

Visões que me atormentam

São dias sem fim


E tu sentes

Não consigo ver

E tu vês

Sem eu perceber


E navego

Sem a tua vela

Onde me perco

Ao beijar a tua tela


Faróis protegendo 

Almas sem rumos

Mare vazios

É fogo sem fumo


Quero gritar o que sinto

Sem medo de espelhos

A minha dor reflectindo


São noites os dias 

Em que acordo sem mim 

Deixei-me num porto

Levado por um mar sem fim


Deixaste-me só

Fiquei apenas comigo

É melhor vou crescer

Leva-me apenas contigo

Em ti...


Agora Nós


Acordo junto a sonhos

Que empurram para o dia

Em que provo o sabor

De tocar esta minha fantasia


Sonhas com a fama 

E o que possa trazer

Vivo por paixão

Pela música que possa fazer


Agora nós

Há contas a acertar

Cunhas esgotadas 

E o valor a provar


Suando 

cada nota que imagino

Amando 

cada palco que piso


Sentindo

essa dor no céu espelhada

Quando 

a morte alcança uma guitarra


Vidas fúteis

Por vidas úteis lutando

Desejo-te mais do que nunca

Arrepias-me do coração à nuca


Sem Rosto


Parado no nada com destino incerto

Teve uma vida contida num livro aberto

Uma cara que conta anos marcados

Lágrimas que vêm

Com sorrisos passados


Começa o dia sem saber se acaba

Morreu a alegria só o corpo se salva


Já nada interessa para quê essa pressa


Sem rosto

Passas por ele não lhe ligas/ o vês

Sem custo

A indiferença que abrigas/ tu és


Utopias que habitas

Uma casa te espera

Nem te lembras de vidas

Não queres saber pudera


Letras: Rúben Real para NINFO  - 2002

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Maçã de Prata

Letras encontradas num baú com cheiro a frutos maduros, uma réstia de Cesário Verde, deambulando de saia na actualidade... São os poemas da Maça de Prata.

Desabafo da Menina

Era uma vez a menina
cheia de vivacidade
um dia escondeu-se no meio
de sete almofadas de idade

não acho bem essa sina
conforma-te ó menina
não acho bem essa sina
conforma-te ó menina

um dia apanhou o cabelo
pintou os olhos sem medo
não fez por esperar a verdade
encarou a mentira de frente
e assim sendo se libertou

pequena menina de cabelos ondulados
e pestanas alisadas
pequena menina

era uma vez a menina
cheia de vivacidade
um dia escondeu-se no meio
de sete almofadas de idade

não acho bem essa sina
conforma-te ó menina
não acho bem essa sina
conforma-te ó menina

um dia apanhou o cabelo
pintou os olhos sem medo
não fez por esperar a verdade
encarou a mentira de frente
e assim sendo se libertou
do cordão que atava a vontade
assim sendo se libertou
do cordão que atava a vontade.

Fruto

Um dia vivi no passado, senti as muralhas e os becos cheirosos
Levei uma saia rodada, senti-me olhada e envergonhada
Deixei
Então as pinturas usadas e o blush rosado na mala em casa
Pintei,
Em vez, um desenho encarnado e abstracto, ache que era inato e
Empenhei

Vivências que achamos pirosas e pouco airosas embalam o futuro
Pitadas de risos e camadas de sonho empilhados no canto da mente

Viajo por campos de milho e relva cortada ao calor do sol
E sinto que guardo comigo este fruto que cheira a saudade e pele queimada
Partilho contigo este dom que sabe a mar e terra molhada
Fantasio sobre noites passadas à beira de cães e pessoas ousadas

Dias menos produtivos e cheio de sinos maltratam o coração
Fornadas de choro calado e meio oprimido que ficam nos rés-do-chão

Pequeno é o sonho
Melhor então a vida.

Letras: Cheila Cunha para Maçã de Prata

NUA - os primeiros rascunhos perfumados

Três poemas carregados por uma mulher. A Dânia deixa-nos mudos, com as palavras soltas ao vento, cabelos sussurrados por folhas brancas. Nua, só.

Sonho Carnal

Sozinha
só e perdida
procuro
o calor

sombra sem alma
mente perdida
procuras o medo
sem razão

sente o calor

deixa levar-te
para a vida
onde o
tempo não
tem fim

vive o
sonho
da realidade
porque é a
verdadeira
esperança
do mundo.

Nua

Sentes-te fria
com os pés
no rio

ao sentir
a lama
na tua pele

dia
gélido
sem sol
alma nua
posta crua
no mundo assim

sentes-te firme
no solo sujo
do papel

e assim se escreve

que é assim que se perde
o norte e o sul
é assim que se inverte
a certeza de estar de pé

pois é certo
que está perto
a macabra decisão

de forçar
fugitiva
essa leve sensação.

Bela e o Monstro

Vem aí
vem aí

vem aí um monstro grande
para te apanhar
p'ra te devorar
p'ra te matar

e vai dançar contigo
a noite toda
e vai-te mostrar que é teu amigo
e vai-te ensinar a dançar

e mostrar que é teu amigo
e o resto é apenas contigo

pois é ele

vem aí
vem aí
vem aí um monstro grande.

Letras: Dânia Jorge para NUA (co-autoria de Bruno Broa)

terça-feira, 5 de maio de 2009

ALF - 1ª Maquete ALF

A irreverência e crueza dos cadernos de uma banda que até há pouco era de dois. Dois irmãos com um nome mutável: Serão os ALF ou os ALF?

Proposta de Viagem

Se me dissesses p'ra partir
Eu com certeza queria ir
No entanto ia pensar
E com certeza iria ficar
Eu não sei se sou normal,
Mas penso pouco no bem e muito no mal
Não és tu que vais mudar
Um dia eu irei quebrar

Se te fores, por favor não me acordes
Ficarei a olhar p'ra ti
A ver-te partir
A ver-te me deixar
A ver-te sorrir
P'ra não mais voltar

O que me dizes pois então?
É uma proposta, um sim ou um não
Ficarei algo triste
Beberei um bom whisky
Mas se isto não resultar
Beberei mais cem até aguentar
Mas não te esqueças de um poema
Não sei se não...
Não vale a pena!

O que foi p'ra nós
Nada mais há a dizer
Um passo de cada vez
Vamos andar
Vamos crescer
E tudo isto irei esquecer!

ParecesUmaTontAtrevida (PUTA)

Nas luzes de um carro eu te vi
Num antro de fumo te reconheci
Peça linda de cetim
Tiras-me do sério

Puta
Pareces uma tonta atrevida

Apanhado na tua teia
Enrolado pela tua língua
Lábios carnudos de veludo
Cabelos loiros

Puta
Pareces uma tonta atrevida

Sentaste, sentiste e provaste
Magoaste, magoei-te e gostaste
Queimaste um dedo no coração
Ficou a marca da paixão.

Letras: Morgado Sénior para Amanhã Levo Flores

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Cinza - Nem preto nem branco

Um novo caderno, um novo cheiro. Descobrimos agora a poesia contida no tom menos definido da paleta de cores... Marcadamente cinza.

Western

A serpente a rastejar
Prende e leva o teu olhar
Num impulso no seu dorso
Vês o mapa escuridão e cal

O duelo pressentiu
O chegar da pele estriada
Mão no coldre e mente aberta
Fogo negro, vôo e espada.

O primeiro a disparar
Sente o coice e vê o mar
O gatilho é o teu Graal

Ar aberto, um vencedor
Mão crispada, olhar curvado
A derrota a ti saiu
Quero a minha a furar-me o peito

Busco o certo e busco o mau
Quero ser um peito aberto
Ir ao chão, o sangue férreo
Sela a minha maldição.

V.E.P. (Vai em Paz)

De gestos trocados tu ligas o carro
A mala vazia e na boca um cigarro

Os vidros são como portas escancaradas
Segues e bebes bem mais desta estrada
Desta estrada

Vai em paz

Para trás deixaste uma morte mais dura
Um olhar mais certo e nos braços ternura

Deixaste uma sina, um passado, uma vida
Abriste a parede a um beco sem saída
Sem saída

Vai em paz
Não olhes nunca para trás
Seguindo em frente
Terás outras dores, outra gente

De gestos trocados tu ligas o carro
A mala vazia e na boca um cigarro

Os vidros são quatro portas escancaradas
Segues e bebes bem mais desta estrada
Qual estrada
Esta escada

Vai em paz
Não olhes nunca para trás
Seguindo em frente
Terás outras dores, outra gente
Gente de corpo dormente
De corpo e paixão mais quentes

Vai em paz
Não olhes para trás
Descansa em paz

Eloquente

Leva-me
Nesses cantos de agitar
Prende-me
Ao torpor de um chão repetido

Dizes-me até amanhã, mas é sempre longe de mais
Porque amanhã, sabes bem...

Falham-me
As promessas que me fiz e as
Sombras de um novelo perdido
Salvam-me

És tão eloquente
Larga-me entredentes
Sai da minha frente

Já que os olhos não desturvam
Sinto os cheiros que perturbam
Cala-me
Mata-me

És tão eloquente
Também sei de imensa gente
Perdida a vida inteira
Segue de coleira

És tão eloquente
Ego efervescente
Eco efervescente

Um Desejo a Rebentar

A flor aberta clama aos céus
Um vôo raso, fértil dor
E larga ao ar o pólen
Larga ao ar a sua flor

E há uma música a voar
Há um desejo a rebentar
Há um sonho imenso e chá
A Primavera a chegar

Vôo consumado, espera a fértil terra
Sol e cor, o cheiro é etéreo
Molhas os dedos nesse lodo sério
Sentes a seiva a entrar

E tu mergulhas no ar
O teu desejo, o teu luar
Dás gritos plenos de luz madura
Quente e suja

Alma máter, sérvia pura, esconso canto, livro santo
Pólen, quantum, rasgo, Rá.

Letras: Gonçalo Miragaia para Nem Preto nem Branco